quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Imaginário I

O primeiro contacto.

Chego, pouso a pouca bagagem.

Olho à minha volta, o olhar prende-se no tecto. Rachas que parecem fendas, fendas que se afastam a uma velocidade tectónica, que os olhos não percebem mas que sei – tenho a certeza – que amanhã estarão pior mesmo que eu não veja que estão pior. Talvez só daqui por meses ou anos é que eu me aperceba que as fendas deram em crateras e que o tecto vá cair. Pode ser que nessa altura eu já cá não more.

Olho as marcas deixadas pelos hóspedes que por cá passaram antes. Demoro-me nos desenhos que ninguém teve o cuidado de limpar, ou simplesmente ninguém quis apagar, como se de uma marcação de território se tratasse.

Dificilmente me vou habituar a este lugar.

Olho as paredes sujas. Mentalmente faço uma lista de coisas a melhorar. Uma limpeza a fundo nestas paredes. Cerzir o colchão. Colmatar as fendas que milimetricamente engordam no tecto. Polir a secretária - está cheia de riscos e vincos feitos, provavelmente, a canivete.

Se vou viver aqui anos o melhor é tornar este lugar o mais aprazível possível. Personalizado. Meu.

Sim, ao menos uma vez na vida terei um sítio só meu. Ainda que para isso tenha que ser aqui.

O primeiro contacto é sempre o mais forte e vinculativo.

(Publicado em 18 Julho 2007)